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Roteiro homilético: 29 de Outubro (30º DOMINGO DO TEMPO COMUM)

Amarás a Deus e ao teu próximo

I. INTRODUÇÃO GERAL

Somos hoje desafiados ao mandamento do amor: a Deus e ao próximo. O Evangelho nos convida a tomar em consideração tal mandamento em vista de nossa salvação. O amor é a essência da vida cristã. Um cristão que não ama é como uma árvore estéril à beira do caminho: ela pode produzir sombras, mas não alimenta ninguém. Somos provocados por esta liturgia a pensar sobre nossa vocação cristã: o amor. A primeira leitura nos propõe construir uma ética que possa beneficiar os mais humildes, sejam eles pobres, viúvas, órfãos ou estrangeiros. Não basta sermos bons, precisamos construir a justiça social. Com efeito, poderíamos pensar que o contrário da pobreza existente no mundo não seria a riqueza para todos ou a opulência, mas a justiça social, que beneficia a todos. Paulo nos anima, na segunda leitura, a manter firme nossa fé e nos tornarmos referências de santidade para as pessoas. Nosso testemunho, como o testemunho da comunidade tessalonicense, é fundamental para que outros se convertam ao amor de Deus, abandonando a idolatria. Nosso culto a Deus e o amor aos irmãos e irmãs são os mais belos evangelhos que podemos ofertar ao mundo, não por palavras, mas por atitudes. Talvez esse seja o único evangelho que muitos possam ler.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

1. I leitura (Ex 22,20-26)

O livro de Êxodo possui um código importantíssimo para o povo de Deus: o código da Aliança (Berit, em hebraico). A Aliança significa um pacto estabelecido entre Deus e as pessoas humanas. Ser fiel é fundamental para preservar a boa relação com o Senhor, que estabelece essa Aliança.

No texto deste domingo, encontramos uma série de prescrições relativas ao estrangeiro, à viúva e ao órfão – figuras sociais veterotestamentárias que representam os excluídos e desprovidos de direitos fundamentais. O pobre também aparece nessa passagem como alguém que deve ser ajudado.

Para essas leis, o importante é restaurar a boa relação entre as pessoas e despertar, nos que têm condições, a preocupação ética com os desprovidos de bens e direitos. O v. 20 diz, de forma categórica e imperativa: “Não maltrates o migrante nem o oprimas, pois vós fostes migrantes na  terra do Egito”. Fazer memória dessa opressão vivida no passado é condição de possibilidade denão se tornar um opressor no presente.

O v. 21 destaca a necessária relação de hospitalidade e bondade para com o órfão e a viúva. Se esses humilhados clamarem a Deus, prontamente o Senhor os ouvirá e pedirá justiça pelo mal praticado contra eles. O v. 24 destaca a relação de empréstimo sem usura, sem cobrança de juros. O v. 25 adverte sobre a hipótese de querer efetuar a penhora de algo fundamental para o pobre, como sua túnica, instrumento de proteção. Deus ainda lembra que, se o pobre clamar por ele, fará justiça e será misericordioso.

O conjunto dessas leis nos motiva a pensar a prática de uma ética saudável e sociotransformadora, que não permita considerar os bens materiais acima do ser humano. O outro, nosso irmão e irmã, é mais importante que os bens que temos; se temos esses bens, cabe nos mostrarmos capazes de partilhá-los.

2. II leitura (1Ts 1,5c-10)

O apóstolo Paulo continua a falar das virtudes colhidas por meio de sua pregação na comunidade de Tessalônica. Tais versículos se dedicam a tratar da fé, virtude teológica primeira, vivida pelos tessalonicenses. Assim, a comunidade, convertida a Cristo por ação do Espírito Santo, tornou-se exemplo para as outras à sua volta. Paulo afirma que os tessalonicenses se tornaram imitadores deles – de Paulo, Silvano e Timóteo –, bem como de outros que lá anunciaram Jesus. Tornaram-se imitadores de Cristo, acolhendo a Palavra como semente que cai em terreno fértil (v. 6). A comunidade confirma os outros irmãos e irmãs com seu testemunho, a todos os fiéis da Macedônia e da Acaia (v. 7). A Palavra por eles anunciada se propagou por essa região; a fé que eles vivem alcançou inúmeros ambientes (v. 8).

Para Paulo, a comunidade fiel de Tessalônica se tornou emblema de conversão do paganismo e da idolatria ao Deus verdadeiro e ao serviço a ele (v. 9). Toda essa virtude colhida pela semeadura da Palavra fará que eles esperem, com perseverança, a vinda de Cristo. Assim, tendo em vista a mesma experiência de Cristo, a ressurreição, é que o povo tessalonicense vive sua fé. A fé em Cristo tornará a comunidade santa (1Ts 4,3), livre das imoralidades.

Esse texto nos faz pensar, contemporaneamente, em nossas comunidades de fé, constituídas de convertidos e convertidas a Cristo. Somos convidados a manifestar os sinais dessa conversão, a fim de que outros também creiam e se convertam.

3. Evangelho (Mt 22,34-40)

A passagem deste domingo é sequência narrativa dos domingos precedentes. Trata-se de uma série de controvérsias entre Jesus e os saduceus, os fariseus e os herodianos, grupos religiosos, sociais e políticos daquele tempo.

A narrativa inicia-se nos v. 34-36: “Quando ouviram que Jesus tinha feito calar os saduceus, os fariseus reuniram-se e um deles, um doutor da Lei, perguntou-lhe, para pô-lo à prova: ‘Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?’” A pergunta é uma cilada imposta a Jesus, para saber realmente o que ele pensava sobre o mandamento da Lei de Deus, se iria relativizá-lo ou absolutizá-lo.

Jesus recorre ao livro do Deuteronômio (Dt 6,5), que oferece as seguintes palavras, proclamadas por Jesus: “Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu entendimento”. Jesus afirma que esse é o maior e o primeiro mandamento; em seguida, acrescenta outro a esse: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo”, fazendo memória do discurso da montanha (Mt 5,43-44), onde se lê: “Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. Eu, porém, vos digo: amai vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei o bem aos que vos odeiam e orai pelos que vos maltratam e perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus”. Jesus acrescenta ao primeiro e mais importante mandamento um outro, que não é menos (por ser o segundo), mas é igualmente importante.

É preciso lembrar que, para a teologia do Evangelho mateano, Jesus é um novo Moisés que vem propor uma nova Torá. Por isso, a narrativa de Mateus segue os principais eventos vividos pelo povo de Israel, associando-os a Jesus. Por exemplo, o fato de Jesus, ainda recém-nascido, ter de refugiar- se no Egito, para entender a ligação com as palavras: “Do Egito eu chamei o meu filho” (Mt 2,15), presentes na seção narrativa que lembra a fuga para o Egito e a volta do Egito para Nazaré (Mt 2,13- 23). Vale recordar, ainda, que, em Mateus, encontramos cinco discursos, a saber: capítulos 5-7; 10;

13; 18; 24-25. Esses cinco grandes discursos nos fazem refletir sobre a nova Torá apresentada por Jesus nesse Evangelho, escrito primordialmente para judeus que estavam experimentando a conversão à fé cristã

Jesus conclui a perícope deste domingo aludindo à Lei e aos Profetas: “Toda a Lei e os Profetas dependem desses dois mandamentos”. Para Jesus, o Antigo Testamento só tem sentido se entendido à luz do amor a Deus e ao próximo. Amar a Deus é absolutamente importante para um judeu piedoso e para um bom cristão, mas amar o próximo é igualmente indispensável para um cristão genuíno. João apresenta, em sua primeira carta, uma estratégia para que o cristão não se iluda em relação ao amor a Deus nem se extravie do amor ao próximo, pois amar a Deus, que não se pode ver, é fácil, ao passo que amar o próximo, nosso irmão que vemos, é difícil. Assim, João afirma: “Se alguém disser: ‘amo a Deus’, mas odeia seu irmão, é mentiroso; pois quem não ama seu irmão, a quem vê, não poderá amar a Deus, a quem não vê” (1Jo 4,20). Dessa maneira, amar o próximo é condição para afirmarmos nossa fidelidade a Jesus e ao Reino por ele inaugurado. Amar é tarefa para os que se converteram ao amor de Deus.

III. PISTAS PARA REFLEXÃO

Nesta liturgia, o Senhor nos oferece a oportunidade de amá-lo, bem como amar nosso próximo. Com base na Palavra de Deus, propor a criação de uma ética mais abrangente, que possa estimular nossa caridade, sobretudo para com os necessitados, os vulneráveis. Convidar a comunidade a refletir sobre seu papel social e espiritual na construção de uma sociedade mais justa, fraterna, pacífica e capaz de reconstituir relações de paz e harmonia. Estimular cada batizado(a) a assumir sua vocação como Evangelho vivo, pedra fundamental na construção de um mundo melhor.

*Pe. Junior Vasconcelos do Amaral é presbítero da arquidiocese de Belo Horizonte-MG. Doutor em Teologia Bíblica pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje – Belo Horizonte), realizou parte de seu doutorado na modalidade “sanduíche”, estudando Narratologia Bíblica na Université Catholique de Louvain (Bélgica). É professor de Antigo e Novo Testamentos na PUC-Minas e publicou vários artigos sobre o Evangelho de Marcos e a paixão de Jesus em perspectiva narratológica. E-mail: jvsamaral@yahoo.com.br

 

Fonte: Vida Pastoral

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